Prejuízo. Gastos com doenças relacionadas ao fumo consomem 30% do orçamento da saúde. (Foto: Robson Fernandjes/AE)
O
Brasil gastou no ano passado R$ 21 bilhões no tratamento de pacientes
com doenças relacionadas ao cigarro, revela estudo inédito financiado
pela Aliança de Controle do Tabagismo (ACT). O valor equivale a 30% do
orçamento do Ministério da Saúde em 2011 e é 3,5 vezes maior do que a
Receita Federal arrecadou com produtos derivados ao tabaco no mesmo
período.
A divulgação foi feita na véspera do Dia Mundial sem
Cigarro, criado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O estudo
demonstra ainda que o tabagismo é responsável por 13% das mortes no
País. São 130 mil óbitos anuais (350 por dia). Os resultados são fruto
da análise de dados de 15 doenças relacionadas ao cigarro. Quatro delas -
cardíacas, pulmonar obstrutiva crônica, câncer de pulmão e acidente
vascular cerebral - responderam por 83% dos gastos.
Os custos,
segundo uma das coordenadoras do estudo, a economista da Fundação
Oswaldo Cruz Márcia Teixeira Pinto, são referentes às despesas tanto no
Sistema Único de Saúde (SUS) quanto na saúde suplementar.
"Há
tempos buscamos números que indiquem o impacto do tabagismo na economia
do País", diz a diretora executiva da ACT, Paula Johns. Um dos
argumentos da indústria do fumo para frear medidas de prevenção é a alta
arrecadação de impostos, além da alta quantidade de empregos
concentrada na atividade.
No debate mais recente, feito durante a
discussão da resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) para proibição de aditivos ao cigarro, a Associação dos
Fumicultores do Brasil (Afubra) apontou que em 2010 a indústria recolheu
R$ 9,3 bilhões de tributos e gerou receita de R$ 4,1 bilhões. "Não
concordamos com o número apresentado por eles de arrecadação. Mesmo
assim, é mais do que a metade do gasto com doenças", afirma Paula.
Segundo
ela, os números mostram que ainda há muito o que ser feito no combate
ao tabagismo. Entre reivindicações está a regulamentação da lei que
proíbe fumo em locais públicos fechados e a da proibição de propaganda
nos locais de venda.
Em 2005, a pesquisadora Márcia Pinto já
havia feito um estudo mostrando que os gastos com o tratamento de
doenças eram de R$ 338 milhões. "A metodologia era diferente." Ela
lembra que foram avaliados gastos apenas no setor público do Rio.
Paula
diz que não se espantou com resultados. "A estimativa é de que a cada
US$ 1 arrecadado com impostos de cigarro sejam gastos US$ 3 no
tratamento."
Diferenças. Márcia, que conduziu o trabalho com
André Riviere, do Instituto de Efectividad Clinica y Sanitaria, da
Argentina, afirma que fumantes no Brasil vivem pelo menos cinco anos a
menos do que os não fumantes. Mulheres dependentes do cigarro têm, em
média, 4,5 anos a menos de vida do que as não fumantes e 1,32 a menos do
que as ex-fumantes. Entre homens, a perda é de 5,03 anos em relação ao
tempo médio de vida dos não fumantes e de 2,05 dos ex-fumantes.
Ao
saber da pesquisa, Romeu Schneider, da Câmara Setorial do Tabaco,
afirmou que os números não refletem a realidade. "Eles são campeões de
chute. Durante 20 anos falaram que o cigarro causava 200 mil mortes. Não
há como saber o que foi provocado pelo cigarro, o que foi causado por
outras doenças."
ENTREVISTA: ‘Gasto é maior que ganho com tributos’
Alexandre Padilha, ministro da Saúde
Qual
é avaliação que o senhor faz do estudo?Ele é um instrumento valioso
para se mensurar o impacto dos custos do tabagismo no SUS. Ele mostra
que, além das vidas perdidas, o tabagismo traz uma perda de recursos
maior do que os tributos recolhidos com o setor. O trabalho reforça a
importância das medidas regulatórias que adotamos.
A lei foi
sancionada ano passado, mas precisa ser regulamentada. Há um prazo para
que novas regras sejam publicadas?Não há prazo definido, mas a meta é
regulamentarmos o mais rápido possível. Vários ministérios estão sendo
ouvidos, há uma tramitação interna, questões jurídicas analisadas. Mas
ela é importante.
Que nova medida será feita para reduzir o tabagismo?
As
medidas regulatórias são fundamentais, elas têm grande impacto,
principalmente entre o público prioritário: jovens, população de mais
baixa renda e mulheres. Já assistimos uma forte redução do número de
fumantes, mas em menor velocidade entre essa população. E, entre jovens,
queremos evitar a iniciação ao fumo. Além disso, vamos reforçar medidas
para ajudar fumantes a parar de fumar, com distribuição de gomas e
adesivos para reposição de nicotina.
O que poderia ser feito com R$ 21 bilhões?
Este
ano o ministério gastará R$ 10 bilhões na compra de remédios em geral,
para doenças como câncer. Os recursos gastos com cigarro são o dobro do
investido em drogas.
Fonte: O Estadão