Nem a morte os separa. Torcedor e time do coração podem continuar juntos
eternamente, se depender da Funerária 'A Caminho do Céu'. No interior
do Ceará, na cidade de Senador Pompeu, 275km de Fortaleza, o conhecido
'Seu Bananeira' oferece caixões estilizados, com clubes brasileiros de
futebol. Para continuar com o time no peito, mesmo sem o coração bater, o
torcedor precisa aderir ao plano de R$ 25, cinco reais mais caro que o
convencional. É uma espécie de consórcio, do qual participam 10 pessoas.
Quando morre um, entra outro 'felizardo'. Se um caixão tradicional
acaba custando aproximadamente R$ 700, o que carrega o emblema de um
time pode custar até R$ 1200. O do Corinthians e do São Paulo,
estilizados dos pés à cabeça e com alças mais trabalhadas, ultrapassam
os R$ 1.800. No estoque, há opções para amantes do São Paulo, Flamengo,
Corinthians, Palmeiras, Ceará, Fortaleza e Botafogo. E Seu Bananeira já
mandou buscar de mais dois times: Portuguesa e Grêmio. - Mas esses são
só pra enfeitar, porque são mais difíceis de sair - admite o empresário.
Há quatro anos, o mercado dos 'paletós de madeira' do futebol movimenta
os apaixonados no interior cearense. O primeiro a aderir ao consórcio,
no entanto, parece ser o que esbanja mais saúde. Afonso Janurário, o
'Caboco', de 54 anos, já encomendou o caixão do Corinthians, apesar da
jovialidade. - Aparento ter uns 40 anos, sou solteiro, namorador. E vou
completo, com calça, camisa, tudo do Corinthians. Ainda vai ter o hino
tocando quando eu for enterrado. Não quero ninguém chorando - brinca o
metalúrgico. Afonso quase foi para o andar de cima na final do
Campeonato Paulista de 1988, contra o Guarani. Viu de perto o gol da
vitória, por 1 a 0, marcado por Viola, mas resistiu à emoção. O dono da
funerária não se importa com a resistência de seus clientes e até torce
para que não morram. - Quanto menos morrer, melhor, porque estou
recebendo (dinheiro do consórcio) e não estou tendo despesas - confessa,
com bom humor, Seu Bananeira. Neste ano, um palmeirense e um
flamenguista já partiram em seus respectivos caixões. No enterro do
torcedor do Flamengo, foi uma festa só, como se o time tivesse acabado
de conquistar mais um título. Apesar de ter ficado famoso com a venda
dos caixões estilizados, o dono da funerária não quer ser enterrado em
nenhum deles. Aos 69 anos, é torcedor do Ceará, exigente, e espera algum
que ofereça mais conforto. - Até tenho o caixão garantido, mas não sei
se vou nele não. Ainda não tem um do Ceará bem bonitão, tem que ter um
mais bonito. Existe caixão de R$ 7 mil. O 'bicho' é tão bonito que dá
vontade de morrer pra ir nele - brinca Seu Bananeira. O torcedor e dono
da funerária chega a ser tão fanático que batizou os filhos, netos e
quem mais pôde com nomes que derivam de 'Gildo', maior ídolo da história
do Vovô cearense, que atuou pelo Alvinegro de Porangabuçu nos anos
1960. A partir do filho, Gildo, surgiram Gildivânia, Gilvânia, Gilvan,
Gildicelia e por aí vai. Se irão morrer, no estilo mais alvinegro, ainda
não se sabe. Mas, se forem tão exigentes quanto o precursor da ideia,
precisarão juntar as economias para encomendar 'algo de luxo'.
G1
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