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´Sentia-me muito mal usando roupas masculinas. Fui trocando meu armário aos poucos pelas femininas e percebi que me sentia bem com as novas peças, que caiam melhor no meu corpo´, conta a modelo Felipa Tavares, de 25 anos, batizada de Felipe.
´Não é fácil fazer essa mudança de um dia para o outro, mas sempre me senti mulher.´
Antes de sequer pensar se Felipa deve ou não comemorar o Dia Internacional da Mulher, reflita sobre a provável trajetória de pessoas como ela. Foram consideradas do sexo masculino ao nascer, batizadas com nome de menino --e criadas como tal--, mas desde cedo sentindo que pertenciam ao gênero feminino. Sem mesmo tentar imaginar a discriminação que a maioria delas sofre diariamente, dentro e fora de casa, fica mais difícil julgar de maneira tão superficial se essas novas mulheres devem ou não se sentir homenageadas no dia 8 de março.
Em 1949, a escritora Simone de Beauvoir disse que ninguém nasce mulher, mas torna-se mulher. E, segundo antropólogos e sociólogos, assim realmente é. ´Para a antropologia e a teoria de gênero, ser mulher ou homem é um aprendizado social, cultural e histórico´, explica Heloísa Buarque de Almeida, professora de antropologia da USP.
A própria transexualidade é uma radicalização dessa ideia: não basta simplesmente nascer com o corpo do gênero feminino. O que basta é sentir-se mulher.´
A maquiadora Thaís Tomazonni, de 20 anos, também dividia a mesma sensação descrita por Felipa: ´Desde pequena, sempre tive dificuldades em me adaptar ao comportamento masculino. Na minha adolescência, não tinha vontade de sair paras festas, por me sentir inadequada´, conta Thaís, que se comportava com a delicadeza que não se espera de um garoto. Para ela, ser mulher vai da escolha da roupa ao comportamento.
E ela considera o Dia da Mulher muito importante. ´Fico feliz cada vez que sou lembrada como mulher. É uma conquista muito grande.´
Quem também defende a teoria é a empresária Agatha Lima, de 40 anos. Para ela, o importante é como cada um se sente e se vê. ´As pessoas acham que ser mulher é ter um órgão genital feminino, mas não é bem assim. Ser mulher é ter uma identidade de gênero.´
O dia das neomulheres
Além de comemoração, o dia 8 de março marca a luta e manifestação pelos direitos femininos. Cristiane Gonçalves da Silva, professora e doutora da Unifesp/Santos, afirma que ´é absolutamente justo que todas usem também essa data por reivindicações que permitam que elas sejam tão cidadãs quanto qualquer pessoa.´
Ariadna Arantes, 27 anos, é um dos exemplos de mulher da nova geração. Ao participar do ´BBB´, sua história despertou a curiosidade do brasileiro sobre o tema, levantou debates e a levou às páginas da revista ´Playboy´, ensaio que serve como grande reconhecimento de sua natureza.
´Ser mulher é ótimo. Não me sinto nem mais nem menos, me sinto eu mesma”, diz ela, que representou a "mulher do novo milênio´ durante o desfile da escola de samba Vai-Vai.
Preconceito, ainda que tardio
Como qualquer mulher em uma sociedade machista, o desafio maior de quem se tornou uma continua sendo o preconceito. ´Qualquer mulher sofre diversos tipos de discriminação. Imagine, então, quando ela nasceu com outro sexo´, diz a professora de antropologia da USP.
Apesar disso, o psicólogo da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar-Sorocaba) Marcos Garcia acredita que, para determinadas profissões, o preconceito está diminuindo. Para ele, carreiras tradicionalmente femininas, como manicure, cabeleireira e maquiadora, são mais receptivas, mesmo que ainda haja barreiras.
´Sou maquiadora, trabalho em salão, e acredito que, por estar nesse meio, é bem mais fácil. Tenho uma boa clientela e nunca tive problemas´, conta Thaís. ´Não me sinto menos mulher que as outras mulheres. Pelo contrário, acho que meu esforço diário não seria encarado com facilidade pela maioria delas´. E mais uma característica une as novas mulheres a qualquer membro do sexo feminino: o anseio por respeito, dignidade e felicidade.
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