domingo, 12 de maio de 2013

Seca revela fósseis de animais da Era do Gelo no Agreste pernambucano


  Atualizado em 11/05/2013 19h45

Ossos foram encontrados em lago no topo de uma serra, em Caruaru.
Descoberta intriga moradores da região e vira desafio para pesquisadores.

Luna Markman G1 PE

Ossos e pedras foram retirados de espécie de lago no topo de uma serra em Caruaru, PE. (Foto: Luna Markman/G1)Comunidade científica já se debruça sobre o material para datar os ossos (Foto: Luna Markman/G1)
Uma descoberta paleontológica no Agreste pernambucano intriga moradores da região e pesquisadores. Com a forte estiagem que abate o Nordeste brasileiro, uma espécie de lago entre pedras no topo de uma serra no sítio Carneirinhos, em Dois Riachos, na zona rural de Caruaru, a 130 quilômetros do Recife, secou completamente pela primeira vez, revelando centenas de fragmentos de fósseis de animais pré-históricos. Entre eles, há exemplares da megafauna, que habitaram a região na conhecida Era do Gelo, há pelo menos 10 mil anos atrás.

Com as chuvas das últimas semanas, o reservatório voltou a encher, mas a curiosidade permanece. Aos poucos, o local começou a virar ponto turístico. A comunidade científica já se debruça sobre o material a fim de datar os ossos e descobrir quando eles foram parar naquele lugar. O G1 foi conhecer o "cemitério de fósseis", que ainda guarda possíveis pinturas rupestres.
José Carlos segura fragmento de osso. (Foto: Luna Markman/G1)José Carlos segura fragmento de osso que achou
no 'lago' (Foto: Luna Markman/G1)
'Tomei um susto'
O responsável pela descoberta dos ossos foi o agricultor José Carlos Silva, contratado pelo proprietário do sítio para limpar a lama que cobria o reservatório, cujo fundo chega a quatro metros. Pelas diferentes colorações nas paredes é possível enxergar os níveis que a água chegou ao longo do tempo. "Logo no primeiro metro, já apareceu um 'bocado' [de ossos]. Eu tomei um susto. Moro há 41 anos aqui e nunca tinha visto isso. Achei fantástico, pensava que era de dinossauro. Parei o serviço para avisar ao patrão", contou.

Professora de história, Elenilma Melo, esposa do proprietário do terreno, foi quem percebeu o valor da descoberta. "Eu disse: 'não bole em nada ai', pois sabia que era tudo muito frágil, podia quebrar. Procurei outros colegas de trabalho, que entraram em contato com a UFRPE [Universidade Federal Rural de Pernambuco]. A notícia tem se espalhado e a gente está cada vez mais ansioso para saber o que tem lá [na lago]", comentou. "Nossa ideia é preservar o local para guardar esse pedaço da história. A casa está aberta para quem quiser nos visitar", complementou o comerciante José Severino Silva, dono do sítio.

O biólogo Alexandre Nunes já analisou algumas peças e identificou, por exemplo, partes de uma mandíbula, de um fêmur e de uma terminação do rabo de uma preguiça gigante, que devia medir seis metros. Também há fósseis de tatus, que na época eram do tamanho de um Fusca; de mastodonte e toxodonte, parentes distantes do elefante e do hipopótamo, respectivamente. "Sabe aquele filme 'A Era do Gelo'? São animais daquele período geológico, o Pleistoceno, que habitavam essa região, favorável à sobrevivência deles, sem mata fechada e com comida. Eles foram extintos por conta das mudanças climáticas, passaram por quatro eras glaciais", explicou.
Biólogo mostra parte de mandíbula. (Foto: Luna Markman/G1)Biólogo Alexandre Nunes mostra parte de mandíbula
(Foto:Luna Markman/G1)
O paleontólogo Gustavo Ribeiro, professor do Departamento de Biologia da UFRPE, está responsável pela análise do material. "Já pegamos mandíbula, ossos longos e ossos menores, cerca de 10 a 15 materiais, que serão estudados para divulgação científica até o fim deste ano. Acredito que os animais iam buscar água naquele local e morriam próximo dali, e as enxurradas levavam os ossos para o fundo daquela depressão. Agora, quando foram parar ali, vamos ter que usar técnicas de isótopos radioativos, como caborno-14, para datação", argumentou o estudioso, que voltará ao sítio, na próxima semana, para recolher mais amostras.

Não é a primeira vez
Esta não é a primeira jazida fossilífera localizada em Pernambuco. Segundo a paleontóloga da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Alcina Magnólia Barreto, há ocorrências em pelo menos 40 municípios do estado. A maior parte fica em Brejo da Madre de Deus, perto do sítio em Dois Riachos, onde há 15 depósitos identificados.
 E eles dão pistas sobre as características dos fósseis encontrados na região. "A datação deles tem ficado entre 50, 60 e 70 mil anos atrás. Entre os fragmentos coletados, estavam ossos petrificados de preguiças, lhamas, toxodontes, mastodontes", apontou. "É importante preservar essa recém-descoberta porque ela pode ser um local chave na compreensão da ocupação da área pela fauna e pelo homem pré-histórico", complementou.

No sítio em Dois Riachos, um paredão com a ponta mais curva, que serviria de abrigo aos nossos ancestrais, tem possíveis pinturas rupestres, que ainda serão pesquisadas. "São desenhos que representam o cotidiano dos homens pré-históricos, que podem ter coexistido ou não com os animais gigantes, isso precisa ser estudado", explica o biólogo Alexandre Nunes.
Fósseis encontrados no local eram, segundo pesquisadores, de animais do tamanho de um Fusca (Foto: Luna Markman / G1)Fósseis encontrados no local eram, segundo pesquisadores, de animais do tamanho de um Fusca
(Foto: Luna Markman / G1)

Paredão tem possíveis pinturas rupestres. (Foto: Luna Markman/G1)Paredão no Sítio Carneirinhos tem possíveis pinturas rupestres (Foto: Luna Markman/G1)
 

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