17/07/2013
Demontier Tenório
Crianças fardadas brincando no terreiro da Fundação Casa Grande de Nova Olinda. (Foto: Demontier Tenório/Agência Miséria)
Uma história que poderia ter caído no esquecimento vem sendo contada e recontada por crianças que é a formação do Kariri. Quando o casal Alemberg Quindins e Rosiane Limaverde criou a Fundação Casa Grande – Memorial do Homem Kariri, certamente jamais imaginou que fosse ganhar tamanha dimensão. Hoje não se restringe apenas à história, mas todo um ambiente de referência em companheirismo, aprendizado, convivência social, trabalho e estímulo ao poder da criação.
O projeto deixou de ser exclusivamente de Nova Olinda ou da região do Cariri e extrapolou fronteiras indo bem longe já com presença forte no exterior. Natural de Crato e aos 49 anos, Alemberg define a iniciativa como espaço de vivência e gestão institucional para crianças, jovens e seus familiares. A base foi montada em quatro programas, sendo o primeiro de Sustentabilidade Institucional voltado para estudos de como o projeto deve ser gerenciado.
Adolescentes tocam a gesta da entidade e a programação da Casa Grande FM. (Foto: Demontier Tenório/Agência Miséria)
O outro de Educação Infantil que cuida na formação das crianças com o terceiro de Profissionalização Juvenil, visando capacitar para o mercado de trabalho e, finalmente, Geração de Renda Familiar quando envolve os pais em torno do turismo comunitário. Hoje, o projeto conta com biblioteca, gibiteca, videoteca, exposição permanente sobre a origem do Kariri, a Rádio Casa Grande FM, a TV Casa Grande, restaurante e um laboratório de informática como espaço de inclusão digital.
Outros importantes equipamentos são o Teatro Violeta Arraes construído dentro de um projeto de arquitetura tão rústico quanto o play ground com madeira, cordas e pneus além de um mini campo de futebol. O mais importante em tudo isso é a enorme contribuição na melhoria dos indicadores sociais no município de Nova Olinda de quase 15 mil habitantes em uma área de 248 Km2 situada a uma distância de 560 quilômetros para Fortaleza, a capital do estado do Ceará.
Teatro Violeta Arraes da Casa Grande numa homenagem a ex-reitora da URCA. (Foto: Demontier Tenório/Agência Miséria)
As idéias, porém não param de chegar e o presidente da fundação, Alemberg Quindins anunciou a criação da coleção “Lendas do Cariri”, que vai contar, também, histórias de ciclos econômicos importantes da região como do algodão e do couro por exemplo. Além dos livros com uma leitura fácil que atinja bem o público infantil dois museus serão criados. Em Nova Olinda, a partir do atelier de Espedito Seleiro na mesma rua da Casa Grande.
O outro em Juazeiro do Norte ligado ao algodão de cuja história restou o time do ICASA (Indústria e Comércio de Algodão S/A) surgido dentro de uma usina o qual, neste 2013, completa 50 anos. O Museu inclui o futebol como ferramenta educativa e será montado no CT Praxedão do clube no bairro Planalto e ambos se transformarão em geotopes do Geopark Araripe. Quanto às lendas, igualmente voltadas para crianças e adolescentes, a bastante conhecida “Pedra da Batateira” em Crato já foi agendada.
Na opinião de Alemberg, desde a época indígena, o Kariri sempre teve uma personalidade forte se constituindo num povo de bastante auto-estima no entorno da Chapada do Araripe que envolve os estados do Ceará, Pernambuco e Piauí. Segundo conta, na época da pré-história a região tinha um culto indígena que representava um grande encontro anual de sapiências. Ele incluiu o Padre Cícero Romão Batista na história definindo-o como um homem que resgatou essa antropologia no Cariri.
Ele historia ainda que a origem do povo do Cariri vem de uma lagoa encantada e tudo já começa na base da lenda. “Padre Cícero falava do Cariri como a terra prometida e sempre ligava menções bíblicas à região sem esquecer a verdadeira história regional. Ele falava a linguagem das pessoas e foi o maior antropólogo do Nordeste”, disse. Hoje, o velho casarão na Rua Jeremias Pereira, 444 recebe cerca de 70 mil visitantes por ano e o espaço até adotou o Hino de autoria do cantor e compositor Moraes Moreira:
Essa casa é tão bonita
Quanto a gente que habita
Desde a rua até a porta
E da sala de visita
Até o fundo do quintal
Todo mundo acredita
Num objetivo igual
Tudo que se reza e pede
É que Deus seja seu
Hóspede principal
Essa casa é tão bonita
Quando a inspiração visita
O coração do cantor
Tem amor e no jardim
Tem a flor amor perfeito
Tem um banco que foi feito
Só para namorar
Tanta coisa e adivinha
Porque me sinto feliz
Alguma coisa me diz
Que essa casa é a minha
Nossa casa é tão bonita
Os meninos da TV Casa Grande já trabalham até produções para a TV Futura e outras instituições nacionais e internacionais. Além disso, operacionalizam o blog www.blogfundacaocasagrande.wordpress.com.br ajudando igualmente na gestão do espaço. Recentemente, a fundação derrubou as cancelas das fronteiras com o exterior e ganhou o mundo com o projeto “Casa Grande, uma viagem aos encantos da Chapada do Araripe” já tendo percorrido a Espanha, Portugal, Itália, Alemanha, Estados Unidos e Canadá.
Trata-se de uma mostra da chapada por meio de exposição fotográfica em baners e exibições em telão divulgando o Cariri em meio a apresentações da Banda dos Meninos da Casa Grande. Além disso, distribuições de folders, CDs e DVDs com idêntico conteúdo o que já rendeu uma parceria com a Fundação Barcelona. O patrono do time espanhol, Henrique Rocca, até já veio ao Cariri conhecer de perto o trabalho e o convênio consiste na capacitação de crianças quando oito já estiveram na Espanha.
A Casa Grande completou 20 anos em dezembro último e nada disso teria acontecido se não fosse a decisão de restaurar o velho prédio. Na década de 70 estava abandonado e se transformando em ruínas sob o pretexto de mal assombrado, muitas lendas e até botijas enterradas da alma do frade que vagava nas horas mortas da noite, arrastando suas sandálias com um candeeiro na mão. Em 1983 Alemberg, neto de Neco Trajano – dono do imóvel, começou a pesquisar lendas para compor, com a esposa Rosiane, músicas que resgatassem a pré-história do homem Kariri.
Nas andanças pelo sertão, além de várias lendas, foi desvendando todo um acervo arqueológico. Em 1992 o casal resolveu restaurar a velha casa grande da Fazenda Tapera para fazer funcionar no espaço o Memorial do Homem Kariri. A casa foi tombada como patrimônio histórico municipal e foi criada a Fundação Casa Grande que deu origem a todo esse trabalho que serve de exemplo para a nação.
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